Estratégias de ampliação do diagnóstico da infecção pelo Vírus da Imunodeficiência Humana no Brasil, 2015
DOI:
https://doi.org/10.51723/ccs.v28i02.210Abstract
INTRODUÇÃO
Desde o início da epidemia, em 1980, quase 78 milhões de pessoas foram infectadas com o vírus da imunodeficiência humana (HIV), destas aproximadamente 37 milhões ainda vivem com o vírus e cerca de 39 milhões morreram devido a consequências desta infecção. Em 2014, foram estimados 2 milhões de novos casos diagnosticados pela infecção com HIV e 1,2 milhões de pessoas foram a óbito por complicações relacionadas. O HIV continua a dizimar as populações na África, Haiti e partes da Ásia, sendo a região da África Subsaariana a mais afetada, com cerca de 26 milhões de indivíduos vivendo com HIV e responsável por 70% dos novos diagnósticos
mundiais l. Além disso, dentre todas as pessoas vivendo com HIV, somente 40% destas estão em tratamento com terapia antirretroviral. 1,2,3
No Brasil foram registrados 798.366 casos de indivíduos com Síndrome da Imunodeficiência Humana (Aids) no período de 1980 até junho de 2015 e com cerca de 12,5 mil óbitos a cada ano. 4,5
Estima‑se que cerca de 0,4% de toda a população brasileira está vivendo com HIV. Apesar do estado do Rio Grande do Sul apresentar a maior taxa de mortalidade de Aids, é na região sudeste que estão concentrados 56% dos casos acumulados da doença. A faixa etária com mais casos de Aids se encontra entre 25 e 49 anos, com predomínio
de pessoas do gênero masculino. 4,5 Tem sido observado um aumento de 10,8% nas taxas de detecção de Aids em homens nos últimos dez anos, em contraste com a diminuição de 18,9% em mulheres, o que reflete na razão de sexos, em 2014, de 190 casos de Aids em homens para cada 100 mulheres. 6
No entanto, a epidemia (propagação da infecção em um grande número de pessoas) é concentrada em grupos populacionais, como homens que fazem sexo com homens, mulheres profissionais do sexo e usuários de drogas, devido a comportamentos que os expõem a um risco maior de infecção pelo HIV. A proporção de casos de Aids em homens que fazem sexo com homens, passou de 34,9% para 44,9% entre os casos totais em homens, nos últimos dez anos. Apesar de serem um grupo importante nos casos de Aids, os usuários de drogas injetáveis tem apresentado diminuição nos casos de Aids ao longo dos anos no Brasil. 6
Com o objetivo de diminuir os índices de transmissão e infecção pelo HIV, nas últimas duas décadas, foram incorporadas estratégias de acolhimento, diagnóstico e tratamento nas políticas de saúde pública do Brasil, as quais se tornaram referência para diversos países no mundo.
Ainda não há cura para a infecção pelo HIV, no entanto, os medicamentos disponíveis atualmente podem retardar a progressão da doença, evitando que a infecção progrida para Aids. Assim, quanto mais precoce os indivíduos se descobrirem infectados e iniciarem o tratamento adequado, menor o dano causado pelo HIV ao sistema imunológico e maior a qualidade de vida do paciente.
Dentre os principais avanços na vigilância e controle da Aids, está a incorporação da investigação da infecção pelo HIV através de exames de diagnósticos, que possibilitam a utilização precoce da terapia antirretroviral, levando a uma queda de 96% na possibilidade da transmissão do vírus, podendo ser utilizada como
uma estratégia de prevenção na gestão de saúde pública. 7
OBJETIVOS
Descrever as estratégias de ampliação do diagnóstico da infecção pelo vírus HIV no Brasil através da revisão das principais políticas, normas e boletins informativos sobre HIV publicados no Brasil, no campo do diagnóstico de 1985 a 2015 e apresentação da evolução cronológica do diagnóstico da infecção pelo HIV no Brasil.
MÉTODOS
Estudo descritivo com base na análise documental do Departamento de DST/Aids e Hepatites Virais (DDAHV) no período de 2013 a 2015.
Foram incluídas portarias, normas, guias do Ministério da Saúde, conforme segue:
1. Boletim epidemiológico de HIV/Aids (2015) 6 , que apresenta as informações e análises sobre os casos de HIV/Aids no Brasil, regiões, estados e capitais, bem como de municípios que apresentam cenário epidemiológico relevante de acordo com os principais indicadores epidemiológicos e operacionais estabelecidos.
2. Informes institucionais, como o “Caderno de Informação – Logística de Insumos Estratégicos, DST, HIV/Aids e Hepatites Virais”, que visa contribuir para o processo de transparência e melhoria na gestão pública, promovendo o acesso a dados sobre o gerenciamento logístico desses insumos.
3. Livro institucional do Ministério da Saúde, “Histórias de luta contra a Aids”, com relatos de pessoas que fizeram parte dos 30 anos de combate a epidemia no Brasil.
4. Cartilhas institucionais, como “Orientações para a implantação dos Testes Rápidos de HIV e Sífilis na Atenção Básica – Rede Cegonha ”, que contribuem na orientação e subsídio dos gestores e dos trabalhadores da saúde na implantação desses testes no âmbitoda Atenção Básica.
5. Guias instrucionais de projetos e programas, como o “Viva Melhor Sabendo”, que apresentam informações do planejamento organizacional para a implantação de cada ação.
6. Portaria nº 488 (17/06/1998) 8 , Portaria nº 569 (01/06/2000) 9 , Portaria nº 59 (28/01/2003) 10 , Portaria nº 34 (28/07/2005) 11 , Portaria nº 151 (14/10/2009) 12 , Portaria nº 77 (12/01/2012) 13 , Portaria nº 29 (17/12/2013) 14 , que regulamentam a utilização de testes diagnósticos no Brasil.
7. RDC nº 52/2015 15 , que dispõe sobre as regras para o registro de produtos para diagnóstico in vitro como auto teste para HIV, para fins de triagem.
8. “Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para Profilaxia Antirretroviral Pós‑Exposição de Risco à Infecção pelo HIV”, que tem por objetivo atualizar as recomendações do DDAHV/MS quanto ao emprego de antirretrovirais para a Profilaxia Pós‑Exposição ao HIV (PEP).
9. Manuais de orientação aos profissionais que realizam testes rápidos, como o “Manual Técnico para o diagnóstico da infecção pelo HIV, segunda edição” e o “Manual Técnico para Avaliação Externa da Qualidade”.
10. Materiais de apoio dos cursos de capacitação TELELAB.
A análise foi realizada a partir da evolução cronológica da ampliação da oferta dos testes de diagnósticos e da estratégia de implementação dentro e fora das unidades básicas de saúde, por grupos populacionais.
RESULTADOS
As políticas de saúde pública para um agravo são aprimoradas quando este começa a ser detectado na população e compromete o fluxo de trabalho vigente. Assim, os relatos dos casos de Aids mundiais e também no Brasil, nos primeiros anos da década de 80, propiciaram a criação da Coordenação Nacional de Doenças Sexualmente
Transmissíveis e Aids, em 1985, para coordenar ações de combate à epidemia e a história de gestão da infecção pelo HIV no Brasil. A cronologia da
evolução nos cuidados da Aids e infecção pelo HIV no Brasil pode ser verificada na Figura 1.
Com o anúncio, nos Estados Unidos da América (EUA), do desenvolvimento do teste imunoenzimático (ELISA – Enzyme‑LinkedImmunosorbentAssay) para detecção
de anticorpos anti HIV, o mesmo começou a ser comercializado no Brasil e utilizado em laboratórios públicos e privados com o objetivo de confirmar as diferentes formas clínicas da infecção pelo HIV e determinar a prevalência em grupos populacionais. 16
Em 1987, tornou‑se obrigatória a testagem de anticorpos anti‑HIV em bancos de sangue para triagem de doadores, com o propósito de evitar a transmissão do vírus aos receptores de transfusão sanguínea. No entanto, não era obrigatória a realização de testes confirmatórios com finalidade diagnóstica aos pacientes com sorologia reagente no teste de triagem. 16
Visando o acompanhamento destes indivíduos, a ampliação da oferta e absorção da demanda social de testes diagnósticos, tanto espontânea quanto provocada, concentrada nos bancos de sangue, entre 1988 e 1989 foram criados, gradativamente, os Centros de Orientação e Apoio Sorológicos (COAS), posteriormente denominados como Centros de Testagem e Aconselhamento (CTA), sendo o estado do Rio Grande do Sul, pioneiro na criação destes serviços. Estas instituições estavam organizadas para, além da testagem para HIV, oferecer ações de prevenção das DST/Aids e organizar atividades extramuros, para atingir as populações mais vulneráveis ou com difícil acesso ao sistema convencional de saúde. 17
A partir de 1989, os testes para o diagnóstico da infecção pelo HIV eram realizados conforme orientações utilizadas nos EUA, que sugeriam a realização de um teste suplementar ou confirmatório aos pacientes que apresentassem sorologia repetidamente reagente em um ELISA. Assim, como metodologia confirmatória, no Brasil, a rede pública passou a utilizar o teste de imunofluorescência indireta, de baixo custo, produzido pela Fundação Oswaldo Cruz, enquanto que a rede privada utilizava o Western Blot, visto que era o de maior oferta no mercado nacional e o teste mais utilizado nos EUA, no entanto, com alto custo associado. 16
Vários resultados falso‑positivos nos testes de triagem não eram confirmados nos testes suplementares, dando oportunidade a ações judiciais movidas contra laboratórios, com pesados ônus indenizatórios, visto que não havia uma regulamentação com orientações legais em relação ao processo diagnóstico. Como consequência, o Ministério da Saúde (MS) edita a Portaria nº 488 em 1998, tornando obrigatória a realização de dois testes de triagem, conforme fluxogramas de testes sequenciais propostos para o diagnóstico de HIV.
Com o aprimoramento dos testes de triagem, em 2003, entra em vigor a Portaria SVS/MS nº 59, que modifica os fluxogramas propostos previamente, retirando a necessidade de realização de dois testes paralelos de triagem, assim reduzindo significativamente os custos totais do diagnóstico.
Em meados dos anos 2000, surgem os testes rápidos (TR), com metodologia que permite a liberação de resultados em até 30 minutos, sem necessidade de estrutura laboratorial e capacidade de ser executado por qualquer operador capacitado, causando uma evolução enorme no diagnóstico da infecção pelo HIV.
No Brasil, a utilização dos TR teve início com a triagem de gestante no terceiro trimestre de gestação que não havia sido previamente testada para HIV, conforme previsto nas recomendações para profilaxia da transmissão materno‑infantil do HIV e terapia anti‑retroviral de 2001. Todavia, os resultados obtidos nos TR eram presuntivos, necessitando o encaminhamento de amostra ao laboratório para esclarecimento do diagnóstico.
Após revisão da metodologia empregada nos TR e extensa discussão, em julho de 2005 é publicada a Portaria SVS/MS nº 34, que propunha a utilização de testes rápidos no diagnóstico de HIV, sem a necessidade de testes adicionais.
Com a finalidade de incluir alterações para a ampliação de acesso ao diagnóstico e consolidar os algoritmos já utilizados no diagnóstico laboratorial do HIV com a utilização dos TR, é lançada a Portaria SVS/MS nº 151/2009. Desta forma, uma das modificações foi a abolição da necessidade de encaminhamento da amostra ao laboratório em caso de resultados discordantes entre o TR de triagem e o TR confirmatório, pois o documento preconizava a repetição do fluxograma TR em uma nova amostra do paciente. No Quadro 1, é possível verificar as alterações nos algoritmos do diagnóstico da infecção pelo HIV com a evolução cronológica das portarias em vigor.
A Figura 2, demonstra o número de testes realizados, de acordo com a metodologia, a partir de 2008, com o propósito de diagnóstico e monitoramento da infecção pelo HIV.
O aumento da utilização de TR no diagnóstico de HIV, sendo realizados nas instituições da Rede Cegonha, nos CTA, na rede de atenção básica de algumas regiões do país revelou a necessidade de um sistema de treinamento de operadores para a execução destes testes. Para sanar esta carência, o Departamento de DST/Aids e Hepatites Virais incluiu na plataforma de educação à distância TELELAB, vigente desde 1997, cursos detalhados sobre peculiaridades de cada conjunto diagnóstico e forma correta de execução dos TR.
Além disso, para verificar a qualidade dos resultados liberados pelos profissionais que executam TR, foi integrado ao Programa Nacional de Avaliação Externa da Qualidade para Rede de Monitoramento e Diagnóstico da Infecção pelo HIV, o Programa de Avaliação Externa da Qualidade para Testes Rápidos (AEQ‑TR). O AEQ‑TR permite que todos os profissionais dos serviços que realizam diagnóstico de HIV, participem de um teste de proficiência rotineiramente, aprimorando suas técnicas e
qualificando o serviço prestado aos usuários.
Considerando a rápida evolução das metodologias para o diagnóstico do HIV, por exemplo, a utilização de testes moleculares, em 2013 entra em vigor a Portaria SVS/MS nº 29 que aprova o Manual Técnico para o Diagnóstico da Infecção pelo HIV. A partir desta data, não houve mais a necessidade de novas edições de portarias que regulamentassem o diagnóstico do HIV, as quais demoravam cerca de um ano para a tramitação, visto que as modificações na regulamentação do diagnóstico passaram a ser realizadas nas revisões do manual técnico, flexibilizando a gestão pública.
Como estratégia de ampliação de acesso ao diagnóstico além dos muros das unidades de saúde, em 2014, o MS em parceria com 69 organizações não governamentais (ONG), que prestam assistência à mulheres profissionais do sexo, pessoas que usam drogas, gays e HSH, travestis e mulheres transexuais, iniciaram o programa Viva Melhor Sabendo. Este programa permitiu, até março de 2015, a realização de 28.400 testes, cuja triagem utiliza amostra de fluido crevicular gengival (fluido oral), em pessoas de localidades de difícil acesso e em horários não convencionais, incluindo as populações alvo nas ações de saúde pública. Também em 2014, foi lançado o projeto A hora é agora – testar nos deixa mais fortes, com o objetivo de ampliar o acesso de jovens gays e HSH à testagem anti HIV por meio de TR com fluido oral disponibilizados por correio, como auto testagem. A utilização conjunta destes TR, com um teste de triagem e um confirmatório, permite testar com maior brevidade os indivíduos que buscam de forma espontânea os serviços de saúde e também aplicar esses dispositivos em campanhas de busca ativa, como por exemplo, os programas
“Fique Sabendo”, “Viva melhor Sabendo”, “A hora é agora”. Os resultados são disponibilizados em 30 minutos, com 99% de confiabilidade.
Em 2015, foram realizadas duas edições do Curso de Formação de Novas Lideranças das Populações‑Chave Visando o Controle Social do Sistema Único de Saúde no Âmbito do HIV/Aids, que tem por objetivo capacitar jovens que compõem as populações‑chave vulneráveis a infecção pelo HIV em líderes para controle social, fiscalizando e acompanhando as políticas públicas de saúde na área de HIV e Aids. Neste mesmo ano, foi realizado em João Pessoa, Paraíba, o 10º Congresso de DST/
Aids e 3º Congresso de Hepatites Virais, composto por congressistas da sociedade civil, do governo, das populações‑chave, do meio acadêmico para discutir resultados das políticas implantadas durante os 30 anos de epidemia no Brasil e traçar novas estratégias para se alcançar a meta 90‑90‑90 proposta pela Organização das Nações Unidas (ONU), onde 90% de todas as pessoas vivendo com HIV saibam que têm o vírus; 90% das pessoas diagnosticadas com HIV recebam terapia antirretroviral; e 90% das pessoas recebendo tratamento possuam carga viral indetectável e não possam mais transmitir o vírus.
Nesse âmbito, em 2015, foi publicado o Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para profilaxia antirretroviral pós‑exposição de risco à infecção pelo HIV, com os esquemas antirretrovirais a serem utilizados. Além disso, estão sendo realizados estudos para incorporação da terapia pré‑exposição nos mecanismos de prevenção e
controle do HIV pelo DDAHV no Brasil. Um marco importante foi a publicação, em 27 de novembro de 2015, da RDC nº 52/2015 pela a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a qual dispõe sobre as regras para o registro de produtos para diagnóstico in vitro, como os auto‑testes para a triagem do vírus HIV, que poderão
ser utilizados por usuários leigos, profissionais da saúde e laboratório clínico, como uma estratégia adicional para a ampliação do diagnóstico.
Outro fato relevante que deve ser mencionado foi o lançamento em julho de 2017, pelo DDAHV, de uma nova e atualizada edição do Manual Técnico para Diagnóstico da Infecção pelo HIV. Esta terceira edição, está em conformidade com a definição da Portaria nº 29 de 17 de dezembro de 2013, realizando alterações segundo os avanços da ciência. Dentre as diversas alterações, o manual substitui o termo “Doença Sexualmente Transmissível (DST)” por “Infecção Sexualmente Transmissível (IST)”, incorpora o fluxo a ser seguido por todos os serviços quando for necessária a investigação da infecção pelo HIV‑2; atualiza os locais e situações para as quais o DDAHV recomenda a utilização dos testes rápidos; inclui um resumo de cada fluxograma visando facilitar ainda mais a compreensão do usuário; altera as figuras dos Fluxogramas 3 e 4; Inclui o item “Falhas na execução dos testes rápidos (TR)” e um item sobre “Recomendações para o diagnóstico da infecção pelo HIV em gestantes”.
DISCUSSÃO
Os dados deste estudo permitem observar que a evolução dos métodos diagnósticos está diretamente relacionada com as mudanças históricas na regulamentação do diagnóstico da infecção pelo HIV. Conforme citado, o aprimoramento dos testes de ELISA, por exemplo, o aumento da sensibilidade e especificidade, permitiu a modificação dos fluxogramas que eram propostos na Portaria 488/98, descartando a necessidade de utilização de dois testes de triagem em paralelo.
A Figura 3 demonstra que os testes de ELISA são um dos testes mais utilizados, visto que são a principal metodologia de triagem nos laboratórios, acompanhando o que pode ser observado no Quadro 1, onde todos os algoritmos, ao decorrer do tempo, apresentam a opção de utilização de imunoensaios como testes de triagem. Ainda na Figura 3, destaca‑se o crescente aumento da utilização de TR no diagnóstico da infecção pelo HIV a partir de 2008, o que corrobora com os dados observados na Figura
1, onde há a inclusão do curso sobre o uso de TR na plataforma TELELAB em 2008, publicação da Portaria 151/2009 e do Manual Técnico para o diagnóstico da infecção pelo HIV (2013), os quais estimulam a realização de testes rápidos e mais recentemente, a realização de projetos para populações‑chave com utilização de TR.
Sabe‑se que a população‑chave em epidemia (gays, pessoas que usam drogas, profissionais do sexo, pessoas transexuais e travestis) ainda enfrentam situações de estigma e preconceito, comprometendo a procura pelos serviços de saúde ou a qualidade do atendimento nestas instituições, aumentando as barreiras de acesso ao diagnóstico precoce do HIV/Aids e ao tratamento adequado. Além disso, outros fatores limitantes à obtenção de diagnóstico é a rotina dessas pessoas, muitas
vezes noturna e de atuação em espaços públicos, o que dificulta o acesso aos serviços em seus horários e formatos de atendimento, postergando o conhecimento de seu estado sorológico. Considerando que as pessoas com diagnóstico tardio têm 6 a 13 vezes maior probabilidade de desenvolverem Aids ou de morrerem no primeiro
ano após o diagnóstico, este se torna um problema de maior grandeza no combate a epidemia. 18
O diagnóstico tardio é o desafio a ser enfrentado para a mudança desse cenário. Assim, o Ministério da Saúde (MS) busca ofertar e realizar o diagnóstico para a detecção do HIV em locais e horários não convencionais, através da busca ativa da população, fazendo com que esta conheça seu estado sorológico e seja integrada as estratégias de atenção básica de saúde.
A implantação dos testes rápidos para diagnóstico da infecção pelo HIV e triagem de sífilis na Rede Cegonha, que consiste na construção de uma rede de cuidados que assegure à mulher o direito ao planejamento reprodutivo, à atenção humanizada a gravidez, ao parto e ao puerpério, bem como à criança o direito ao nascimento seguro, ao crescimento e ao desenvolvimento saudáveis.
Assim, o diagnóstico oportuno da infecção pelo HIV e da sífilis, estão inseridos no âmbito do componente pré‑natal da Rede Cegonha como uma das ofertas que objetivam qualificar o cuidado materno‑infantil. Os testes diagnósticos estão disponíveis tanto para as mulheres durante o período gestacional, quanto para suas parcerias, tornando‑se fundamental para a redução da transmissão vertical de HIV e sífilis. 19
De acordo com o histórico da implantação do diagnóstico do HIV no Brasil, foi possível observar a importância da criação dos COAS/CTA para a ampliação e referência nas testagens para HIV. Além disso, a parceria com as organizações da sociedade civil (OSC), que já desempenham uma articulação junto às populações‑chave, é uma estratégia para o desenvolvimento de ações de saúde e melhoria da qualidade de vida dos usuários.
Com exceção de TR, todos os demais métodos de diagnóstico exigem infraestrutura física específica, profissionais extremamente capacitados e alto custo de equipamento e de insumos, desta forma, esses exames são realizados apenas em laboratórios de médio e grande porte. Assim, observa‑se que o uso de TR permite a ampliação de acesso ao diagnóstico por meio de ações que vão além das instituições de saúde, como por exemplo, o Programa “Viva Melhor Sabendo” e o projeto “A hora é agora”. Assim, estas ações garantem que as populações‑chave descubram a sua sorologia, evitando o diagnóstico tardio, que resulta em baixa qualidade de vida dos usuários e altos custos nos serviços terciários de saúde, no atendimento de pessoas já em estado de Aids.
Contudo, verifica ‑se que a combinação de estratégias de prevenção, diagnóstico precoce e efetividade no tratamento resultam no controle da epidemia de Aids e redução da transmissão do HIV, propiciando que o Brasil alcance a meta de diagnosticar 90% das pessoas vivendo com HIV, disponibilizar terapia antirretroviral para 90%
das pessoas diagnosticadas e 90% das pessoas recebendo tratamento possuam carga viral indetectável e não possam mais transmitir o vírus.
Neste contexto, é possível propor o modelo lógico para o diagnóstico da infecção pelo HIV seguido pelo DDAHV, onde apresenta como problema o crescimento do número de casos de HIV/Aids no Brasil, desde seu surgimento, combinado a altas taxas de morbidade e mortalidade. Assim, através da elaboração de normativas, como
a Portaria 29/2013, da disponibilidade de recursos financeiros para aquisição de insumos (testes diagnósticos e medicamentos), recursos humanos para atendimento da população é possível desenvolver ações como busca ativa de populações‑chave, através de programa e projetos na atenção básica de saúde, ampliando o acesso diagnóstico, realizar capacitação de profissionais para realização do diagnóstico (TELELAB), monitorar a qualidade do diagnóstico realizado (AEQ‑TR) e fornecer tratamento aos pacientes com sorologia reagente.
Com este processo, é possível observar como resultado, a ampliação de acesso a um diagnóstico acurado e precoce, tratamento imediato, assim interrompendo a cadeia de transmissão viral e diminuindo a morbi‑mortalidade associada ao HIV. Como exemplo deste modelo lógico, pode citar‑se a Rede Cegonha, onde há ações focadas no
atendimento de gestantes, como a oferta de TR para o diagnóstico de HIV, possibilitando intervenções medicamentosas antirretrovirais precocemente e consequentemente diminuindo a transmissão vertical do HIV e evitando casos de Aids em crianças.
CONCLUSÃO
Conclui‑se que são crescentes as iniciativas para a ampliação do acesso ao diagnóstico da infecção pelo HIV, estando em consonância com os princípios da equidade, integralidade e universalidade de acesso aos serviços de saúde do Sistema Único de Saúde.
Além disso, verificou ‑se que as estratégias de diagnóstico e tratamento precoce adotadas apresentaram bons resultados nos últimos anos. Como exemplo disto, é a taxa de detecção de HIV por 100.000 habitantes, que caiu para menos de 20 casos em 2015, passando a ser a menor taxa de detecção dos últimos 12 anos (19,7/100.000).
A ampliação do acesso ao diagnóstico laboratorial do vírus HIV no Brasil, paralelamente à política de tratamento abordada pelo Ministério da Saúde do Brasil, poderá impactar de forma importante para se atingir a meta 90‑90‑90 proposta pela ONU.
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References
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